quarta-feira, 16 de julho de 2008

Relatório da PF insinua mais do que prova

Meu comentário das 11 e 30 na Rádio Mundial AM1180:

Desperdicei algumas horas do meu tempo, ontem, lendo as 210 páginas do relatório da Polícia Federal sobre o caso Daniel Dantas.

É cansativo porque está mal escrito, usa aquela linguagem típica dos tiras e, principalmente, porque exagera nas transcrições de diálogos telefônicos e por e-mail que deveriam ser fortes indícios dos crimes atribuídos ao banqueiro, mas que na maioria dos casos não conseguem convencer o leitor.

Convenceram o promotor e o juiz, se é que eles tiveram tempo de ler todo o texto, mas ficam geralmente na base da insinuação.

Da leitura do relatório inteiro é possível retirar três conclusões que não são boas para Daniel Dantas e que, bem apuradas, o que ainda não foi o caso, podem mesmo levá-lo à prisão:

Prática de sonegação de impostos.

Uma enorme confusão na organização societária das empresas do grupo Opportunity, com o objetivo de esconder o nome do verdadeiro proprietário de todas elas – Daniel Dantas.

Investimentos feitos pelo Opportunity para clientes residentes no Brasil em fundos no exterior que só podem ter como aplicadores gente que mora fora daqui.

Finalmente, um último provável crime cometido por Daniel Dantas, que nem aparece no relatório, é a suposta tentativa de suborno de um delegado da Polícia Federal por 1 milhão de dólares. A PF diz ter provas gravadas do suborno, que fingiu aceitar, mas ainda não as revelou.

É claro que tudo isso já seria o suficiente para deixar Daniel Santas encrencado.

Basta lembrar que Al Capone, o gângster da Chicago dos anos 30, foi preso por sonegação de impostos e não pelos muitos assassinatos que cometeu.

Mas o relatório, francamente, é decepcionante. E chega a beirar o ridículo, em muitos momentos.

Reproduz diálogos que não permitem concluir nada e acrescenta, logo depois, análises que concluem muita coisa. A gente lê e fica pensando: de onde eles tiraram esta conclusão? Será que eles sabem de algo que não está escrito aqui? E se não estiver escrito aqui, tem valor legal?

No capítulo do relatório que se refere ao suposto domínio de Daniel Dantas sobre repórteres e setores da mídia, também é difícil concluir alguma coisa.

Vários nomes são citados, alguns muito conhecidos, mas nunca em situações em que fique claro que eles se deixaram usar pelo banqueiro.

O único caso mais claro é o pedido de prisão da jornalista Andrea Michael, da Folha, por ter escrito uma reportagem que revelava que Daniel Dantas estava sendo investigado pelo delegado Queiroz.

Queiroz considera a publicação da notícia um crime de vazamento de informação sigilosa, o que chega a ser engraçado, já que eu nunca vi um relatório vazar tanto da PF para a imprensa como este. A Folha assegura que publicou notícia verdadeira e que, portanto, não há ilegalidade alguma.

Tanto não há que o juiz que mandou prender Daniel Dantas recusou o pedido de prisão da jornalista.

Nos blogs e nos sites, mas principalmente nos blogs, trechos do relatório são citados como prova do envolvimento desonesto de jornalistas com o banqueiro.

Blogueiros trocam acusações e esgrimem trechos do relatório.

Mas uma leitura isenta do texto, como a que eu tentei fazer, não permite conclusão alguma em relação à mídia. Daniel Dantas, aparentemente, não usou a imprensa mais do que costumam fazer políticos, empresários e governantes. Passou as informações que lhe interessava. Acreditou nelas quem quis.

Se algum jornalista levou um capilé, deve ser um desses que costuma arrancar dinheiro de qualquer fonte. A imprensa, acreditem, tem chantagistas. Alguns são donos de jornais, até aqui no Rio, e sobrevivem desta maneira. Mas isto não vale só para Daniel Dantas. E nem significa que toda a imprensa pode ter sido dominada por ele, como o delegado chega a afirmar.

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