terça-feira, 14 de outubro de 2008

Um envelope pardo derruba favoritos. E um telefonema?

Tudo o que for importante deve ser publicado?

O que é, afinal, importante?

Quem deve tomar esta decisão?

Velhos dilemas da mais antiga das profissões, e me refiro ao jornalismo.

Em 1992, editor de política do Globo, em plena campanha eleitoral para prefeito, recebi um envelope pardo, sem identificação do remetente - bastou abrir para suspeitar que vinha de Cesar Maia, um dos candidatos - com cópias de documentos que revelavam que Benedita da Silva, candidata favorita, havia empregado de maneira irregular dois filhos e um enteado na Câmara de Vereadores. Eles obtiveram estabilidade no emprego sem a prestação de concurso público. Além disso, apresentaram documentos forjados para comprovar nível de escolaridade que não tinham.

Eu era eleitor de Benedita. A maioria dos jornalistas da editoria de política também.

O que fazer?

É claro que fiz esta pergunta a mim mesmo e tomei uma decisão: nomear um repórter para apurar a veracidade dos documentos e, se fossem verdadeiros, publicar tudo.

O repórter indicado para a apuração se recusou a cumprir a pauta. Passei para outro, também eleitor de Benedita, que acatou a determinação, apurou os fatos e, no dia seguinte, me disse: "É tudo verdade".

A denúncia foi publicada, com muito destaque, e não há dúvida de que prejudicou muito a candidatura da petista. É possível que Benedita tivesse perdido de qualquer maneira, já que Marcelo Alencar, prefeito pedetista, decidiu conduzir o partido para o apoio clandestino a Cesar Maia quando percebeu que sua candidata, Cidinha Campos, era um blefe.

Mas é certo que Benedita perdeu muito com a acusação de que, no mínimo, compactuou com uma fraude promovida pelos seus rebentos.

A propósito, o repórter que se recusou a apurar a matéria foi demitido por mim, na primeira oportunidade, pouco tempo depois, apesar de ser um amigo a quem devia gratidão.

Na semana passada, um repórter do Globo ouviu Fernando Gabeira conversando ao telefone celular em que xingava a vereadora Lucinha. Disse de Lucinha o que ela é: analfabeta política com limitações suburbanas.

Devia ter escrito o que ouviu?

O editor devia ter publicado o que ele escreveu?

O presidente do Ibope, Luiz Augusto Montenegro, anda dizendo por aí que Eduardo Paes vai ganhar a eleição justamente por causa do telefonema de Gabeira. Seria o erro colossal que pode derrubar um favorito. Não levo a sério as afirmações de Montenegro desde que o Ibope cometeu um erro descomunal na apuração da tendência do eleitorado carioca no primeiro turno.

Não posso presumir que a edição da notícia sobre o telefonema tenha sido rigorosamente isenta e desinteressada.

Mas estaria mentindo se censurasse o repórter que apurou a matéria.

Ele fez jornalismo.

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