segunda-feira, 12 de janeiro de 2009

Anatomia de uma cascata

A seguir, reproduzo a abertura de uma reportagem do Globo de hoje, sobre palestinos que vivem no Brasil e têm parentes na Faixa de Gaza.

Leiam a história deste palestino que fugiu para o Brasil e seu filho, que ficou em Gaza e, depois, verifiquem se o relato não causa em vocês a mesma impressão que provocou no blogueiro:

- Baba (papai), não quero morrer aqui em Gaza. Por que você não me levou para o Brasil? Você não me ama mais?

Foram as últimas palavras que Houssan Hejazi Khalil, de 37 anos, ouviu do filho Aihan Houssan, de 9, ao telefone, há duas semanas. Houssan é um dos 108 palestinos refugiados no Brasl há 15 meses. O Itamaraty já liberou visto para o menino ser trazido ao Brasil, mas as Nações Unidas não conseguem tirá-lo de Gaza. Mesmo sem conseguir novos contatos, Houssan não cogita a hipótese de Aiham ter sido vítima dos últimos ataques.

- Respondi a ele: 'não morra, por favor. Espera mais um pouco, o papai vai trazer você ao Brasil'. Sei que vou conseguir - disse Houssan, lembrando a presença do ministro Celso Amorim em Jerusalém.

- A ONU não tem valido mais nada, mas quem sabe o Lula não consegue trazer meu filho?

Segundo o representante do Alto Comissariado nas Nações Unidas para os Refugiados, Javier Lopez-Cifuentes, o governo brasileiro fez o possível, sem sucesso:

- Não há como tirar o garoto de Gaza. Israel não permite.

Agora, as perguntas que a matéria suscita no blog:
  1. Comecemos pela mais direta e evidente: que espécie de canalha foge da Palestina e deixa por lá um filho de, na época, menos de oito anos? Talvez os leitores que não têm filhos não percebam a validade da pergunta. Eu tenho. Jamais me tornaria refugiado de um lugar a não ser que pudesse carregar minha cria junto comigo. A única hipótese admissível, caso a separação fosse obrigatória e vivesse em meio a uma guerra, seria a oposta: dar um jeito de mandar o filho embora de Gaza e ficar, para tentar sair quando fosse possível. Isto se conseguisse alguém que pudesse zelar por ele no Brasil. Mas é bom lembrar que não havia uma guerra quando Houssan deixou a Palestina. A vida podia ser difícil, e certamente era, mas o país não estava sob ocupação israelense.
  2. Por que, no último diálogo que teve com o filho que abandonou em Gaza, há 15 dias, o pai implora ao menino que "não morra, por favor", se naquele dia a guerra ainda não havia começado. O ataque israelense à Faixa de Gaza começou há 10 dias. Há 15 dias, a única ação militar na região eram os disparos dos mísseis do Hamas em direção ao território de Israel. O palestino que abandonou o filho inventou um diálogo e a repórter não percebeu a mentira?
  3. Se é verdade que o Itamaraty já liberou um visto para o menino abandonado pelo pai em Gaza, por que cargas dágua ele esperou uma guerra para providenciar o resgate do garoto? Não teve tempo antes dos últimos dez dias para lutar pela vinda do filho para o Brasil? Por que está esperando tanto por isso?
  4. Finalmente, a mais especulativa das perguntas, certamente a mais maldosa, mas não seria honesto escondê-la: a reportagem, por iniciativa do palestino refugiado, não estaria apenas oferecendo ao governo brasileiro a oportunidade de criar um fato que emocione o país, ao manifestar a confiança de que apenas Lula consiga trazer o menino para os braços do pai?

Um comentário:

Anônimo disse...

Caro Marona, a segunda objeção está errada. A ofensiva israelense começou em 27 de dezembro, portanto, há 17 dias.

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