O ÚLTIMO BAILE FISCAL
José Roberto de Toledo
Para quem chegou ao poder com o compromisso de frear a gastança
e arrumar a bagunçada economia brasileira, a coleção de feitos e desfeitos do
governo interino em 40 dias pode surpreender – pelo menos os infelizes que não
são iluminados pelo sol de Brasília.
Medida provisória de Michel Temer
obrigou a União a dar R$ 2,9 bilhões para o governo do Rio de Janeiro, em
parcela única, ainda em 2016. A desculpa é a segurança da Olimpíada. O motivo é
que o Rio quebrou. Outros Estados também choraram e ganharam carência para
pagar suas dívidas – um calote legal e a prazo. Devem ganhar a mesma folga no
pagamento de dívida de R$ 10 bi com o BNDES. Prefeitos viram, berraram e querem
mamar também.
A epidemia de reivindicações de
acesso facilitado aos cofres não parou aí. Aliados da base movediça chiaram, e
o governo interino acelerou a assinatura de convênios da União para que possam
ter efeito nas eleições municipais deste ano. Também teve de abrir a porteira
para o preenchimento dos cargos de segundo e terceiro escalão com indicações de
deputados e senadores – pondo fim à promessa de cortes maciços das funções
comissionadas.
Antes, haviam saído da caneta
presidencial com aval do Congresso aumentos salariais para as castas mais
privilegiadas do funcionalismo federal. O Ministério do Planejamento – sob
interinidade dupla – se embananou no cálculo de quanto custarão os reajustes e
foi corrigido por um repórter. Não sairão por menos do que R$ 67 bilhões. Esses
aumentos têm efeito cascata nos Estados. Logo, o alívio para os cofres dos
governadores é transfusão da União para compensar a sangria que Temer agravara.
Tudo isso foi feito em nome do
ajuste fiscal, do saneamento das contas públicas e da solvência da dívida do
Estado brasileiro. Sério. Sem abrir a torneira agora, Temer não teria como
fechá-la depois. Pelo menos é o que prega o discurso oficial. O presidente não
está comprando a consciência dos parlamentares, apenas fazendo um investimento
no seu comportamento futuro, quando chegar a hora de cortar. Acredite quem
quiser. E muita gente quer, principalmente em Brasília e no mercado.
Quem duvida é porque já viu esse
filme antes. Governos fortes podem cortar primeiro e negociar depois. Governos
frágeis gastam por conta para tentar angariar as fichas que lhes faltam. No
caso de Temer, não se trata nem de um governo, mas de uma ponte, um remendo até
quando o impeachment chegar. Os aumentos bilionários são para tentar garantir
que ele deixe de assinar no Diário Oficial da União como “vice-presidente no exercício da
Presidência da República”. É o preço do fim da interinidade.
Tudo indica que – do ponto de
vista do PMDB – o investimento vai se pagar. Os senadores que não declaram seus
votos sobre o destino de Dilma Rousseff não recusam convite para encontrar com
Temer. É só uma questão de chegar a um denominador comum. O problema é o prazo.
Quanto mais demora, mais cara fica a interinidade e o seu fim. Já aumentou pelo
menos uma semana, e sabe-se agora que não terminará antes de 9 de agosto.
Como consequência, a única medida
real de contenção de gastos públicos proposta pelo governo do PMDB por enquanto
– a emenda constitucional que impõe um teto anual cada vez mais baixo para as
despesas – não deve ir a voto no Congresso em menos de 90 dias, na hipótese
mais otimista. O mais provável é que demore mais de 120 e só seja votada depois
das eleições de outubro. Até lá, deputados, senadores, governadores, prefeitos
e burocratas sabem que quem berrar mais alto sugará mais.
O Brasil assiste ao que lhe é
vendido como o último baile fiscal. Enquanto isso, quem pode se empanturra o
quanto dá. Depois que a orquestra parar, prometem Temer e Henrique Meirelles ao
mercado, a música será outra. Advinha quem vai dançar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário