quinta-feira, 10 de julho de 2008

Algemou, prendeu, soltou...

Meu comentário das 9 e 30 na Rádio Mundial AM1180:


Eu disse aqui ontem que Daniel Dantas seria solto em 24 horas. Era apenas uma aposta, claro. À noite, escrevi no meu blog um texto em que criticava a prisão fácil que resulta na libertação rápida e acaba não dando em nada. Escrevi assim:

É difícil negar que, dependendo do acusado, a imagem do sujeito algemado e tentando esconder o rosto ao ser levado para o camburão dá mesmo um certo prazer. Pode ser sádico, mas é verdadeiro. Não é menos verdade que, depois de assistir a tantas prisões de criminosos pés-de-chinelo, algemados e muitas vezes com marcas de bofetões, acabamos nos acostumando com a prática.Mas é preciso que se diga, sempre. É tão truculento com o bandido pobre quanto será com o criminoso rico. Não importa a cor do colarinho. No estado democrático, no estado de direito, quem autoriza a polícia - federal ou não - a humilhar publicamente suspeitos e acusados?O que nós temos direito de querer é um inquérito bem sustentado, que resulte na prisão dos acusados e na sua posterior condenação. Se for para fazer Daniel Dantas dividir um quarto da PF com Celso Pitta por duas ou três noites e soltá-los depois, sem a necessária competência para provar nos tribunais que eles são culpados e merecem uma pena definitiva, nos restará, ao final, apenas aquele prazer sádico que dura pouco e acaba em frustração.As algemas no momento da prisão podem nos fazer sorrir. Mas o sorriso deles no momento da libertação ofenderá a todos nós.”

Pois o que eu e o Brasil temíamos aconteceu. Daniel Dantas, a irmã dele Verônica e outros nove diretores do banco Opportunity foram soltos no início desta madrugada. É a manchete da maioria dos jornais brasileiros, pelo menos nas segundas edições.

O presidente do STF, Gilmar Mendes, assinou o habeas corpus pedido para cada um deles depois das 11 e meia da noite.

E não adianta querer crucificar o presidente do STF. A Polícia Federal cometeu dois erros jurídicos que favoreceram os acusados.

Justificou as prisões por dois motivos: para que os suspeitos não pudessem atrapalhar a coleta de provas e para que todos eles fossem devidamente interrogados.

Gilmar Mendes, o ministro, respondeu que, primeiro, a coleta de provas já foi feita e está citada no inquérito; e, segundo, não existe na lei autorização para prender alguém só para interrogá-lo. O sujeito pode até ser preso se, intimado a depor, deixar de comparecer. Mas nunca ser preso para depor.


Outra manchete importante está no Dia:

“Polícia mata 15 vezes mais na Zona Norte que na Zona Sul”.

A população da Zona Norte é quase cinco vezes maior que a da Zona Sul, mas o número de mortes ocorridas em supostos confrontos com a polícia é 15 vezes maior. Entre janeiro e abril, morreram em choque com a polícia 225 pessoas na Zona Norte e 15 na Zona Sul.

O jornal informa que o número de homicídios também é muito maior na Zona Norte, e aqui não se está falando em confronto com a PM. Nos primeiros quatro meses do ano, houve 340 homicídios na Zona Norte contra 13 na Zona Sul.

O que fica faltando é uma análise do jornal sobre estas informações. Dito assim, sem mais dados, parece apenas que a polícia da Zona Norte é muito mais truculenta e que há um número muito maior de assassinos entre os civis desta região da cidade.

Faltou dizer, por exemplo, que mais de 80 por cento das favelas do Rio, quase todas ocupadas por facções de traficantes, estão na Zona Norte. A Tijuca, por exemplo, tem duas dezenas de favelas, todas dominadas por facções criminosas.

Faltou dizer que há muito mais traficantes na Zona Norte. Que se rouba mais carros na região, em parte porque as ruas mal iluminadas facilitam o trabalho dos ladrões, o que é culpa da prefeitura.

Faltou dizer muita coisa para contar toda a verdade. Faltou interpretação, obrigação de qualquer jornal que não queira ser engolido pela internet.

Nenhum comentário:

Postar um comentário