Este trecho do livro "Pós-guerra: uma história da Europa desde 1945", de Tony Judt, em que o historiador faz um balanço sobre as guerras na região da ex-Iugoslávia, estabelece com clareza culpas e responsabilidades. Confirma a histórica covardia ou tibieza dos grandes países europeus, que se omitem em nome de certas tradições e ficam à espera da ajuda dos Estados Unidos - país que tanto criticam.
"Quem terá sido o culpado da tragédia na Iugoslávia? Muita gente foi responsável. As Nações Unidas demonstraram, de início, pouco interesse na questão - o secretário-geral, Boutros Boutros-Ghali, incompetente e desinteressado, definiu a Bósnia como 'guerra de rico' -, e, quando finalmente chegaram aos Balcãs, os representantes da organização se dedicaram a obstruir qualquer ação militar decisiva contra os piores agressores. Os europeus se saíram pouco melhor. A França, especialmente, demonstrou clara relutância em identificar o culpado do curso dos eventos na Sérvia, e até mesmo uma nítida indisposição de se envolver.
"Portanto, quando, em setembro de 1990, Washington quis incluir a Iugoslávia na pauta de um encontro da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE), a ser realizado em Paris, François Miterrand acusou os americanos de fazer um 'dramalhão' e rejeitou a proposta de inclusão. Quatro meses depois, quando a questão voltou à baila, o ministério das Relações Exteriores da França agora dizia ser 'tarde demais' para uma intervenção estrangeira... Paris continuou sem disposição de cooperar, mesmo depois que as forças internacionais foram obrigadas a agir na região: o general francês Bernard Janvier, comandante da força de proteção da ONU na Bósnia, proibiu ataques aéreos contra as forças sérvio-bósnias em Srebrenica. Já o governo holandês chegou a vetar qualquer ataque da Otan a fortificações sérvio-bósnias até que todos os soldados holandeses estivessem sãos e salvos, longe do país.
"Outros países se saíram melhor, mas não muito. Embora a Inglaterra, no fim, apoiasse a pressão norte-americana em prol da intervenção, as autoridades britânicas passaram os primeiros anos do conflito iugoslavo tentando, em surdina, impedir qualquer envolvimento direto por parte da CE ou da Otan. E o tratamento dispensado pelos britânicos aos refugiados iugoslavos foi vergonhoso: em novembro de 1992, quando o fluxo de bósnios desesperados e apátridas chegava ao auge, Londres anunciou que nenhum bósnio poderia entrar no Reino Unido sem o devido visto. Era a traiçoeira Albion, cínica como sempre. Não havendo embaixada britânica em Sarajevo para expedir tais vistos, o único caminho para uma família bósnia era por intermédio de uma embaixada britânica em algum outro país... mas, nesse caso, o governo do Reino Unido declarava que, se a família já havia conseguido asilo em outro local, a Grã-Bretanha não precisava mais recebê-la."
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